Mais usinas hidrelétricas na Amazônia


Obras da UHE Santo Antônio, rio Madeira
Telma Monteiro

Em várias oportunidades as autoridades do setor elétrico têm afirmado que as usinas a "fio d'água"[1]  que estão sujeitas aos regimes de cheias e secas cada vez mais acentuados das bacias hidrográficas, devido às mudanças do clima, podem ser um equívoco[2].  Essa mudança de enfoque por parte do governo pode significar uma espécie de antecipação de futuros projetos com reservatórios maiores. Na Amazônia, onde os rios são de planície, a catástrofe seria incalculável.

A moda das grandes hidrelétricas a "fio d'água", no Brasil, começou no projeto da usina hidrelétrica Luiz Carlos Barreto de Carvalho, no rio Grande. Para enfiar goela abaixo da sociedade a insanidade do barramento do rio Madeira, o governo criou a teoria de que as usinas a "fio d'água" solucionariam os impactos ambientais, pois os reservatórios seriam menores. É tão evidente que a tese não se sustentou que, agora, claramente, está se tentando revertê-la. O resultado pode ser ainda mais desastroso, pois além do risco de se construir novas hidrelétricas na Amazônia, há o de que venham a ter reservatórios como os de Balbina e Tucuruí.

Os futuros empreendedores candidatos às concessões agradecem! Maiores reservatórios significam maiores investimentos alavancados com dinheiro público do BNDES, mais impactos que demandam inclusive mais ações de mitigação e compensação socioambientais, mais escavações, mais concreto, mais ferro, turbinas e o pior de tudo, mais desmatamento, mais violação dos direitos humanos e mais pressão sobre unidades de conservação e terras indígenas.
Parte 1 da lista de hidrelétricas planejadas para a região Norte
 Uma rápida passada pelos dados do Relatório de Acompanhamento de Estudos e Projetos de Usinas Hidrelétricas da Aneel, atualizados em junho de 2012, dá a dimensão desse declarado "potencial" hidrelétrico só na Amazônia: 79 projetos hidrelétricos entre grandes e pequenos, nas diversas fases de projeto, na região Norte – 3 no Acre, 10 no Amazonas, 3 no Amapá, 23 no Pará, 13 em Rondônia, 4 em Roraima, 22 no Tocantins, 1 no Maranhão. (inserir tabela 45); 196 projetos hidrelétricos na região Centro-Oeste – 161 no Mato Grosso, 19 em Mato Grosso/Amazonas, 1 em Mato Grosso/Goiás, 4 em Mato Grosso/Mato Grosso do Sul e 1 em Mato Grosso/Pará.  A grande maioria está localizada na Amazônia Legal. 
Parte 1 da lista de hidrelétricas planejadas para a região Centro-Oeste


[1] "Usinas hidrelétricas “a fio d’água” são aquelas que não dispõem de reservatório de água, ou o têm em dimensões menores do que poderiam ter. Optar pela construção de uma usina “a fio d’água” significa optar por não manter um estoque de água que poderia ser acumulado em uma barragem. Esta foi uma opção adotada para a construção da Usina de Belo Monte e parece ser uma tendência a ser adotada em projetos futuros, em especial aqueles localizados na Amazônia, onde se concentra grande potencial hidrelétrico nacional. Aliás, as usinas Santo Antonio e Jirau, já em construção no rio Madeira, são exemplos dessa tendência." http://www.brasil-economia-governo.org.br/2012/03/05/o-que-sao-usinas-hidreletricas-a-fio-d%E2%80%99agua-e-quais-os-custos-inerentes-a-sua-construcao/

Comentários

  1. Algumas hidrelétricas fio d´água dependem da regulação feita por um reservatório de acumulação rio acima. É assim com as hidrelétricas do Tietê e provavelmente com algumas do Grande. O mesmo "roteiro" é o que está sendo seguido agora em Belo Monte. Anuncia-se que Belo Monte será fio d´água para "alegrar" os ambientalistas, e depois enfiam hidrelétricas de acumulação rio acima. Esse pessoal não dá ponto sem nó.

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  2. Construir ou não mais reservatórios não é uma questão objetiva. Primeiro, é preciso que existam locais apropriados que vão se tornando cada vez mais escassos. Não podemos menosprezar o trabalho dos ambientalistas, pois foi graças à ação dos mesmos que se tornou possível a redução do reservatório de Belo Monte para ridículos 516 km² de área alagada, conservando a mesma capacidade instalada. Isto mostra quão pouca importância têm reservatórios de usinas de fio d’água e de foz, como é o caso.
    “O tempo de o Brasil construir hidrelétricas com grandes reservatórios, como fez durante as décadas de 70 e 80, já passou” (Altino Ventura).

    Agora – depois de 4 meses de térmicas funcionando plenamente – os reservatórios continuam esvaziando até atingir o nível mínimo, que é quando deveriam estar iniciando. Mesmo com a permanência de térmicas ligadas pelo ano todo não há mais tempo para enchimento neste verão que está terminando. Chegaremos ao próximo verão com os reservatórios quase vazios.
    Isto não é nada “normal”. A situação difere daquela de 2001: apagão seguido de racionamento por falta de energia. Hoje, sobra energia hidroelétrica – segundo o próprio ONS – e existe alternativa térmica, eólica e de biomassa, mas falta chuva para encher os poucos reservatórios. A demanda cresceu e o sistema se tornou mais complexo: precisa haver redundância de linhas para reduzir o risco no transporte de energia distante ou falta gás para acionar termoelétricas. O preço da energia pode ficar mais caro por uns tempos, mas é a melhor maneira de afastar provável racionamento e ingressar em um sistema hidrotérmico com geração distribuída: cada um gerando a sua própria energia. Esta é maneira dos empresários contribuírem com sua parcela.
    Assim como ousou rever concessões e reduzir encargos sobre tarifas – uma ação constrangedora para suas próprias empresas – deveria condicionar a redução a uma contrapartida daquilo que foi um pedido dos próprios empresários (da FIESP), ou seja: a aquisição de térmicas de reserva.

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  3. A Região Amazônica reúne as piores condições de armazenamento de energia por meio de reservatórios. A configuração não é, tipicamente, a de uma bacia única integrada, mas várias bacias isoladas, cujos rios não têm ligação física entre si, nem com os rios do Sudeste o que é um obstáculo a integração. *
    Considerando que, localmente, a maior parte dos potenciais tem pequena altura e que a superfície alagada deva ser limitada por questões socioambientais, os novos reservatórios, comparativamente a Furnas, terão volumes reduzidos por dois fatores: altura e superfície alagada.

    Construir reservatórios na Amazônia é “chover no molhado”, isto é, transformar a região mais inundada do mundo num gigantesco espelho d’água, capaz de interferir no clima. O relevo, por si só, já constitui um obstáculo natural. Significa repetir a experiência mal sucedida da construção de açudes que transformou o nordeste no semi-árido mais inundado do planeta..

    O que mais caracteriza os potenciais da região Amazônica é que em sua maioria são potenciais de fio d’água, de baixa altura local e situada em planície de baixa altitude, tecnicamente incapazes de constituir estoques de energia.

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